Resenhas de Kdrama

Resenha e análise de ‘W’: mistura quase perfeita entre romance, fantasia, ação e existencialismo

‘W: Dois Mundos’ é um dorama dublado na HBO, que mistura romance, suspense e ficção científica, criando uma trama única e envolvente: a mocinha vai parar em uma história em quadrinhos, onde se apaixona pelo protagonista e tenta ajudá-lo a resolver um mistério de assassinato. Inspirada por um quadro de Goya, a série, composta por 16 episódios, foi ao ar em 2016 e rapidamente conquistou uma legião de fãs graças à sua narrativa inovadora.

Onde assistir W dois mundos dublado em português

Por enquanto não tem para assistir na Netflix esse dorama. A HBOMax comprou os direitos da série e passou a exibir o dorama dublado em 2023, embora eles tenham o péssimo hábito de soltar a dublagem por pedaços e simplesmente não avisar nem que ela existe, nem quando atualizam.

Roteirista e Diretor

O roteiro de “W: Two Worlds Apart” é assinado por Song Jae Jung, especialista em elementos fantásticos, autora de As Células de Yumi, Memórias de Alhambra e Nine Times Time Travel. A habilidade dela em entrelaçar elementos de ficção científica e romance fica mais uma vez evidente aqui, demonstrando seu talento em criar narrativas complexas e envolventes. No entanto, assim como em algumas outras produções, o final parece apressado e embolado. As conclusões de suas histórias, segundo avaliações de espectadores, nem sempre acompanham a ótima premissa.

A própria autora admitiu que não se importava com finais e só os escreve porque os fãs a criticaram anteriormente: “Eu não me importo com finais. Não importa se é feliz ou triste. Escrevendo o final de ‘W’ sem pensar muito, acabei ouvindo muitas críticas dos espectadores. Só começo a me concentrar no fim quando lembro que é importante e que é algo que as pessoas vão lembrar”. Infelizmente, isso fica muito traduzido na obra. No entanto, respeito e admiro o fatro de que ela apenas segue o que sente que a história deve conter, independentmeente de ser uma conclusão feliz.

A direção ficou a cargo de Jung Dae Yoon, que anteriormente trabalhou em sucessos como ‘She Was Pretty’ e ‘The Heirs’. A capacidade de Jung para dirigir cenas emocionantes e visualmente impressionantes é um dos muitos pontos fortes de ‘W’. O dorama é belíssimo e continua atual.

Protagonistas

Han Hyo Joo é conhecida por seus papéis em Garota do Século 20, Happiness (2021), Dong Yi e Brilliant Legacy. Ela interpreta a médica Oh Yeon Joo (na dublagem, “O Yon Djô”), que é filha do autor da renomada webtoon. A personagem é a típica protagonista genérica, bondosa e doce, mas com o tempo vai crescendo em você.

Ao lado dela, Lee Jong Suk, muito conhecido por seus papéis de galã em Big Mouth, Romance is a Bonus Book, Enquanto Você Dormia, Eu Ouço a Sua Voz e Pinóquio. Ele interpreta o personagem Kang Chul (na dublagem, eles estão chamando de “Kenxú”). Na minha opinião, este papel foi um dos melhores da carreira dele, porque mostra uma versatilidade na ação e seriedade investigativa, em vez de ser apenas um par romântico.

Quero ressaltar também o incrível trabalho do ator Kim Eui Sung, que fez o pai da Yeon Joo e criador de W. Multifacetado, participou de grandes tramas políticas e de ação, como Black Knight, Crônicas de Arthdal, Mr. Sunshine, Memories of the Alhambra, My Fellow Citizens, Taxi Driver e Sob o Guarda-Chuva da Rainha. Ele tem uma veia para vilão que torna tudo muito interssante.

O que esperar?

‘W’ não é um dorama típico. O roteiro é inteligente, bem pensado e cheio de reviravoltas inesperadas que irão prender sua atenção do início até quase o fim. Os três últimos episódios derrapam, mas a entrega final continua positiva.

Mesmo se você só busca romance, os protagonistas são bonitos juntos e seus momentos, mesmo que sejam “do nada” e claramente feito para fanservice, são agradáveis e fofos.

É o suco da fantasia! Se você não conseguir abstrair da sensação de que tudo precisa ser real, vai ser difícil de ver, porque a fantasia em torno das viagens entre o mundo dos quadrinhos e o nosso é bem forte. Mesmo assim, fiquei impressionada como as regras do mundo criado pela autora são mantidas e relembradas até o final e servem para todos os personagens. Não é porque o rapaz é o protagonista que ele não está submetido aos efeitos que outros personagens estiveram. É difícil ter uma história coerente assim. Esse detalhe estimulou meu cérebro toda vez que alguma regra do mundo era trazida de volta.

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Só música boa

Outro ponto maravilhoso é a TRILHA SONORA. Só música boa, instrumentais que inspiram e são marcantes. Minhas favoritas foram compostas por Jung Se Rin, de O Juiz do Diabo, Penthouse e The Glory. Incrível! Tudo que ela compôs é inspirador e complementa demais a trama, tornando sua identidade única. O tema principal é composto pela Jung Se Rin e o compositor Kim Joon Seok, que participou de todas as mais agitadinhas. Tem também trilha da Lee Roo Ri, responsável pelas músicas compostas no piano. ela esteve na trilha de Mother (excelente!), Não Sou um Robô, Weightlifting Fairy Kim Bok Joo e Save Me.

É claro que não podiam faltar as ballads. You In The Fantasy foi minha favorita, que segue aquela fórmula de rap e um vocal contagiante balada fofo (grupo Inkii).

Metaficção e inspiração para a história

Inicialmente, ela gostaria de usar uma viagem por meio de obras artísticas, mas os problemas de obtenção de direitos autorais fizeram com que ela criasse o manhwa “W”. Explorando a quarta parede, a série é completamente metalinguística, ou seja, um roteiro que aborda roteiros; personagens que se tornam conscientes sobre serem personagens e tem até críticas de espectadores que ela deve ter lido em sua carreira. É brilhante, fazendo com que a história se volte sobre si mesma, questionando a sua própria existência ou a da autora. Me pareceu um pouco uma autocrítica da autora para si mesma, alguma fase que ela tenha passado ao escrever roteiros.

Após W, ela planejava escrever mais uma história sobre viagem no tempo (Como Nine e Queen In Hyun’s Man), mas acabou se inspirando para Memórias de Alhambra.

Análises e questionamento existencial

Em entrevista, a autora revelou que o quadro “Saturno Devorando Seu Filho”, do pintor espanhol Francisco Goya inspirou a criação da obra.

Nesta pintura perturbadora carregada de simbolismos que dá o ar da graça em uma cena do dorama, o deus Saturno (ou Cronos, na mitologia grega) devora um de seus filhos, representando a ideia de um pai destruindo sua própria criação.

Do ponto de vista da psicanálise, além do complexo de Édipo escancarado (conflitos por dominância e poder entre pais e filhos – assim como Kang Chul e seu “pai”), temos aqui uma simbolização da angústia relacionada ao desejo e medo da morte causados pelo nosso narcisismo, já que a consciência de finitude nos traz uma sensação impotente diante de algo maior inevitável.

Outro elemento importante seria a sublimação artística de Goya, assim como desconfio que a roteirista tenha feito ao simbolizar seus próprios conflitos internos através das emoções de seus personagens. Assim como Kang Chul que flerta com ideações suicidas por causa do sofrimento de seu desenhista.

A relação de Kang Chul com o criador da série muito parece com questionamentos do ser humano e O Criador, que surge, especialmente, durante essa consciência de mortalidade. A trama traz uma riqueza de discussões existencialistas impressionantes para um dorama.

Essa corrente filosófica, que se originou no século XIX e XX através das obras de filósofos como Søren Kierkegaard e Jean-Paul Sartre, coloca uma ênfase particular na existência individual, na liberdade e na escolha. Segundo o existencialismo, a existência humana é irracional e inexplicável, e é o indivíduo que dá significado à sua própria vida através de suas escolhas e ações – mais ou menos como vemos a trajetória tanto do protagonista como do vilão da série, em tornarem-se “reais” com suas escolhas que fogem do “destino” determinado pelo criador.

Quando o personagem Kang Chul quando se dá conta de que foi criado e que seu propósito de vida é uma mentira, acaba passando por um arco de ansiedade, solidão e impulsividade em busca de sua libertação. Uma das cenas mais rápidas, mas significativas, é quando o protagonista assume o holofote de sua história e diz que não se importa com a opinião dos leitores sobre seu final.

De toda forma, o arco do personagem é concluído quando ele resolve aceitar sua mortalidade como parte do que significa uma “vida real” e abrir mão do mundo narcísico e perfeito do qual fez pasrte, “destruindo” sua história ilibada no processo para iniciar outra, menos empolgante, mas com um final previsível em mente, que é a morte.

O que não é tão legal

Embora ‘W’ seja uma série inovadora e bem executada, ela também tem suas falhas, que todo dorama de fantasia está sujeito, mas eles até conseguem desviar bem. Em alguns momentos, a narrativa pode se tornar um pouco confusa, devido à sua natureza complexa e ao grande número de reviravoltas. A partir do episódio 11, confesso que comecei a me perder. Os três últimos foram uma correria pouco envolvente, com muito “morre/não morre”, o que destoa de todo o clima da série.

No início, o que mais me incomodou foi só a loucura embaraçosa que a Yeon Joo fez com a história dos quadrinhos de W e penso que teria como ela ter feito intervenções mais inteligentes. Acho que dava mesmo para manter o mistério dos quadrinhos E intervir nele. Teria me agadado mais, mas lá pelo episódio 12 eu já tinha aceitado que a história era assim mesmo e o próprio protagonista me deu um fora dizendo que não estava nem aí com o que acontecia nos quadrinhos. Achei interessante como ele assume o controle de sua vida e não liga para o que acontece. Tem também muito vai e vem de trama na segunda metade, penso que poderia ter embarcado para um final de uma vez.

Conclusão

Apesar de suas falhas e dos três últimos episódios, ‘W’ é, sem dúvida ,um dorama singular, que traz uma experiência emocionante e envolvente que é difícil de ser copiada. É mesmo uma experiência inovador e especial que não deve ser ignorada por causa desse ou daquele comentário negativo.

O romance é doce, fofo e agradável, sendo uma cereja no bolo de uma história inacreditável. Com um roteiro inteligente, atuações acima da média e direção habilidosa, é definitivamente uma série que entrou para a história e que vale a pena assistir de forma atemporal.

Se você está procurando um dorama excepcional, diferente de tudo que você já viu, que mistura romance, suspense e ficção científica de uma maneira única e interessante, ‘W’ é uma excelente escolha.

Avaliação: 4.5 de 5.

Recomendações

É difícil falar de metalinguagem se não falarmos de Extraordinary You, que é sobre uma personagem secundária e um figurante de quadrinhos que se dá conta de sua insignificância e começa a mudar a história, contra a vontade do narrador. É adorável e focado no romance.

2 comentários

  1. Enquanto via esse pequeno corte de cena que você colocou do protagonista se transformando do desenho para a realidade, lembrei do clipe de Take on Me, do A-ha, o primeiro que me lembro de brincar com o real e os quadrinhos. Tua resenha tá incrível, dá vontade de ver agora.

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