Resenhas de Kdrama

CONSIDERAÇÕES SOBRE PERSONA: O JOGO DO AMOR

O Jogo do Amor é o primeiro dos quatro curtas da série. Com uma duração de 19 minutos e dirigido por Lee Kyung Mi, a história tem como enredo a rivalidade entre duas mulheres que decidem apostar, numa desigual partida de tênis, o futuro do relacionamento delas.

Parece uma sinopse bastante simples para um episódio tão curto, mas o nível de complexidade e profundidade dele consegue dar um pequeno nó na cabeça de quem assiste – pelo menos deu um nó na mente de quem vos escreve.

Com pouquíssimas falas e muito mais cuidado com angulações, luzes, sons, músicas e fotografia no geral, o Jogo do Amor tenta transmitir mais do que é visto, como se fosse uma experiencia sensorial, ainda que você não possa sentir pessoalmente os elementos. A suculência do pêssego que IU come no início da história – e que aparece num momento posterior, dando um outro contexto para a fruta; a intensidade dos olhares que vão da raiva e inveja para o desejo, paixão, súplica, rendição e redenção; o foco no suor escorrendo da pele, fruto de um desgaste físico e emocional gerado pela partida; e os sons de gemidos quando se rebate uma tacada de tênis e que, fatalmente são associados a uma imagem mais sexual, são alguns exemplos do que você escuta e vê quando assiste, mas para pessoas que tem uma maior facilidade de imersão acabam se entregando como se estivesse lá, como um dos personagens.

O curta traz quatro personagens: IU, uma jovem-adulta mimada e competitiva em evidente conflito emocional; Doona, uma mulher mais madura e segura de si, professora de inglês e excelente tenista que namora o pai da IU; o pai da IU que não tem um nome; e um estrangeiro que IU chama para seduzir sua futura madrasta, mas que não cumpre muito bem sua função.

Apesar do ciúme pelo pai ser apresentado como o centro da discussão num primeiro momento, eu senti que os homens, não representam apenas seus papéis – o pai ou o amigo-pretendente. A história nunca foi sobre eles e sim muito mais pelos sentimentos evidentes, e outros tantos reprimidos, que IU possui por Doona e que parecem ser correspondidos, em certa altura da trama. Não dá nem para chamar de personagem, porque eles ficam como mera figuração. O que me leva a crer que eles estejam representando, na verdade, o Arquétipo do Animus de Carl Jung que existe nas personagens IU e Doona – mas talvez muito mais para a primeira. Ou seja, o lado masculino dentro da psique feminina que, geralmente, ganha a figura de pai, namorado, o divino, por conta da imagem inconsciente que a mulher projeta graças as experiencias que tem em sua vida.

Já a Persona IU – já que o título da série nos leva para este caminho de analisar esse estudo – me parece dividir a cena com o arquétipo Shadow. São arquétipos opostos, porém, conforme as expressões da Persona vão mudando e começam a transmitir dor, medo, frustração, apresenta uma brecha para se discutir os desejos reprimidos que seriam moralmente inadequados para a sociedade em que a Persona vive. E, diante de todo o foco que se deu para a gotículas de suor na pele, ângulos um pouco mais ousados, olhares e os gemidos das devoluções do tênis, pode ser que tenha sugerido uma questão de dúvida sobre a própria sexualidade e o quão reprovável seria para uma jovem adulta desejar ou se apaixonar por uma mulher mais velha, sua própria professora de inglês e namorada do pai. Por isso talvez tivesse tanto empenho de ganhar aquela partida, mesmo que já fosse perdida – afinal, nunca foi um jogo justo, visto que Doona tinha muito mais habilidade no tênis do que IU. E todos sabiam que ela já tinha perdido o jogo. Não era apenas pelo jogo, era para provar o quão profundo ela conseguia ir para lutar por algo que desejava.

Uma outra visão seria que Doona talvez representasse tudo aquilo que IU gostaria de ser, mas estava longe de ser. Mesmo assim, Shadow continuaria se revelando. E conforme os minutos de filme vão passando, as expressões dela vão se relevando, como se a máscara da Persona inicial – uma menina mimada, invejosa, sexy, bonita e manipuladora – desse lugar ao que ela realmente era: uma menina desesperada que estava o tempo todo lutando contra ou por seus próprios desejos.

No entanto, eu ainda acho que a primeira hipótese é a mais indicada, até porque existe um elemento que aparece muito em cena: o pêssego. Se você observasse apenas o modo como IU devora o pêssego e evidencia sua suculência já dava para ter a impressão. Contudo, eis um detalhe: o pêssego é uma fruta afrodisíaca. Sua textura, seu perfume, sua cor e a suculência – novamente – fazem com que a fruta seja associada a luxúria.

Quanto a experiencia sensorial do curta, eu não sei se pode ter uma relação ou não, mas uma pequena curiosidade: As duas personagens IU e Doona possuem os mesmos nomes de suas respectivas intérpretes, Lee Ji Eun e Bae Doona. Inclusive, esta última, foi a Sun da série Sense8, também da NETFLIX. Sense8 foi uma série que abordava acerca de tabus da sociedade e como 8 pessoas pertencentes a etnias e culturas completamente distintas podem compartilhar um mesmo dom, o Sensate. Através do Sensate, eles descobrem que estão mental e emocionalmente conectados, sendo capazes de se comunicar, sentir e aprender habilidades e linguagens alheios. Talvez a atriz não tenha sido uma escolha ao acaso, considerando que as personagens de Persona pareciam compartilhar tudo dentro daquela partida de tênis.

Espero que minhas deliberações não tenham entediado o caro leitor. Realmente achei Persona um filme complexo, mas com mensagens que deixam muito o que pensar. Love Set talvez tenha sido meu filme favorito, apesar de não ter gostado da antologia.

Mas o que você achou? Deixe seu comentário dizendo se concorda ou não com a análise! Sua opinião é sempre bem-vinda!

Você encontra o episódio disponível no catálogo da NETFLIX

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