XO, Kitty é uma série da Netflix de 10 episódios que conta a história de uma garota que vive o “sonho coreano” e se muda para a Coreia do Sul para encontrar suas raízes. A personagem é a irmã mais nova da protagonista de “Para Todos os Garotos que Já Amei”, trilogia de livros homônimos da autora Jenny Han.
Ao contrário de seus antecessores, a série não é baseada nos livros da escritora, que participou como co-showrunner – o que significa que ela teve decisões criativas da série, mas não sozinha.
Embora isso não seja um dorama, mas uma série americana, o público é claro: pessoas que gostam da cultura da Coreia do Sul — ou talvez seja o grande público e o que eles pensam das pessoas que curtem a cultura pop da Coreia do Sul. A classificação de 12 anos já alerta para a proposta bem leve e bobinha da trama – eu só não antecipava quão realmente forte era essa última característica.
Para começar, foram os 10 episódios com mais cara de “poderia ser um filme” que eu assisti nos últimos tempos. Francamente, estava no episódio 4 quando percebi quantas horas do meu dia eu me dediquei para uma trama tão sem sal. Queria gostar de Com Carinho Kitty, de verdade, mas começo a entender melhor a revolta dos franceses com Emily em Paris quando a mesma saiu. Arrisco a dizer que XO Kitty é uma versão coreana (ruim) da série Emily, com uma misturinha de “Herdeiros” e o que há de mais vergonha alheia nas tramas antigas de k-dramas, mas, na maioria das vezes, sem a parte que a gente suspira ou acha fofo – uma exceção aqui para as interações com a Yuri, que são bem bonitinhas.

A fórmula é igualzinha, com doses de kdrama antigo:
Estrangeira deslumbrada que vai para um país sem conhecer nada da língua ou das tradições. “Caramba, eu tenho que aprender coreano”. Sério essa fala da protagonista sentada no aeroporto embarcando para um intercâmbio? Sério?
Em Emily em Paris, pelo menos, quando a protagonista dava suas gafes, uma população inteira a julgava e a fazia aos poucos começar a entender que não é legal ser “turista que se acha moradora”, mas aqui isso não acontece: os personagens logo parecem “abraçar” a garota e quem dá um fecho nela pelo MÍNIMO DE EDUCAÇÃO que ela deveria se prestar à cultura dos outros é transformado em vilão instantâneo.
Tem também uma fusão aqui da melhor amiga rica patricinha e a amiga com um suposto triangulo amoroso com a protagonista (forjado, que é o twist dos doramas antigos, os casais por contrato, mas sem nenhuma tensão real aqui, porque a protagonista por algum motivo muito anticlimático desconfia de cara da armação).
Indo para o lado coreano da coisa, há dezenas de estereótipos baseados em séries coreanas dos anos 2000 que deixam Com Carinho, Kitty com cara de paródia de Tiktok. Sim, são “referências”. Sim, é “engraçadinho”, mas se torcer esse pano de trama com as referências não sobra nada.
Um dos piores clichês utilizados aos montes aqui é o de “erros de comunicação”. Quando alguém quer contar algo importante sempre é interrompido, ou “uma confusão acontece”. Bem preguiçoso
Dentro desse tema temos também a explosão de músicas coreanas sem o menor contexto, e aqui vou destilar um pouco o que me mais me fez contorcer na cadeira. A bomba de músicas de kpop colocadas em momentos absolutamente aleatórios e seguidos sem nenhuma liga sequer do ritmo da música com o momento me deixou horrorizada. É um Momoland chiclete para ilustrar uma personagem perdida na rua seguido de Blackpink para introduzir do nada a patricinha e de repente uma Somi para entonar um atropelamento. Por quê????? Foi um caça-audiência tão óbvio que eu só pensava nas palavras da resenha pipocando violentamente antes de terminar o episódio.
Os personagens
Temos aqui a Anna Cathcart, atriz canadense, interpretando a protagonista, Katherine “Kitty” Song-Covey, uma menina aqui impulsiva e que de alguma forma convence seus pais a terminar os estudos em uma escola da Coreia do Sul sem falar uma palavra do idioma a fim de supostamente conhecer suas raízes – mas ela só foi atrás de um namorado que conheceu no Tinder mesmo. A personagem é extrovertida, invasiva e bastante egoísta, focada no mundinho dela. Achei difícil de simpatizar.
O galãzinho da série é Choi Min Young, que fez participações em doramas como 25 e 21, Itaewon Class, Radio Romance, Rainha por Sete Dias e Mr. Sunshine. O personagem é o típico garoto pobre de dorama, filho do motorista, que acaba envolvido em um relacionamento por contrato para manter o emprego do pai. Porém, o personagem é um poço de carisma invertido.
A não-tão-vilã assim é Gia Kim, que interpreta Yuri, a patricinha mimada que é apaixonada por Juliana, uma dançarina intercambista que foi afastada por seus pais ricos maus. Aqui é uma misturinha da melhor amiga da Emily (pobre menina rica em descoberta) com vilãs clássicas de dorama (a Rachel, de Heirs me vem a cabeça), mas não é uma coisa nem outra. Na verdade, é a única personagem interessante e tem um twist muito legal na história, que seria ótimo se fosse um filme curtinho sobre isso.
O outro galãzinho é o Sang Heon Lee (Bad and Crazy), que eu honestamente shippei desde o primeiro momento que ele surgiu, porque ele é o estereótipo de bad boy de dorama que nós gostamos, mas falta material no roteiro e na construção de personagem para que ele não seja só uma caricatura de moleque rico. Tem que comer muito arroz com kimchi para ser o Lee Min Ho em Herdeiros. Falta charme, falta verdade, mas foi o único da série que achei mais ou menos tragável no começo.
Por último que valem a pena ser mencionados são: a participação do Taecyeon (de Vincenzo), e o professor mal-humorado que me representou 100% durante essa série em relação à atitude inconsequente e excessiva da protagonista.
O que mais me incomoda?
Tudo nessa série tem cara de dorama de baixo orçamento lançado somente em plataforma digital com 5 episódios e produzido por série de streaming de dorama. Só que é da NETFLIX com um orçamento provavelmente com uns três zeros a mais.
O roteiro é capenga, com personagens que tomam atitudes sem graça e cômicas mesmo em situações que deveriam ser “dramáticas”. É difícil de simpatizar e acompanhar. Por exemplo? Depois de chegar na Coreia do Sul e descobrir que seu namorado de internet tem outra mulher, Kitty assume, como primeira hipótese, que o namorado esta fingindo um relacionamento. E ela está certa. Que trama se sustenta com isso? Cadê o mistério?

O pai do protagonista quando descobre uma situação surreal e dispara: “Uau você está namorando a filha do chefe. Quer me contar algo? Legal”, bate no ombro dele e sai. É isso. A colega de sala, afirmando que é fã do casal, pergunta se os namoradinhos falsos têm outras aulas juntos e ele responde “Não tenho certeza” e o diálogo acaba aí.
Falta alma, charme e “verdade”, mas em vez disso eu só vejo marketing, marketing e marketing, penteado com lindos uniformes, cenários e explosões de língua coreana sendo falada e músicas do nada. A ideia é legal, mas é claro que ninguém queria fazer isso do jeito “melhor”, apenas mais lucrativo. A essência do dorama e o que faz ser tão amado (o carinho, a delicadeza em trabalhar temas sérios sem subestimar a audiência, os oppas fazendo fanservice…) nada disso está aqui.
Com carinho, Kitty explora o sonho coletivo de ser uma intercambista em um harém invertido na Coreia, mas me faz preferir ler uma fanfic de Wattpad sobre a S/N. Todo mundo gosta da protagonista sem o menor motivo e do nada, sem muito desenvolvimento, o que me fez sentir que estava jogando uma visual novel de celular.
E agora?
Tudo bem que não era para ser um dorama, mas foi feito pensando em pessoas como nós, mas é claramente a visão que a indústria norte-americana e ocidental num geral tem desse universo, pois a tentativa é trazer identificação. A imagem da fã, mulher, histérica fazendo estupidez por causa de homens coreanos aleatórios é o tipo mais pobre de representação da fatia do fandom e eu fico apenas triste com isso. Isso existe? Sim. Mas ser a protagonista? Não sei se é a melhor escolha para uma personagem que parecia tão inteligente nas séries anteriores.
É para pessoas mais novinhas, mas qualquer filme de Sessão da Tarde clichê da Disney dá um baile nisso aqui. Não há nada aqui que me faça pensar que vale o investimento de tantas horas. Poderia ser um filme e, para ser “Emily em Paris”, falta muito, muito carinho. Para piorar tudo, a série não termina para fazer uma nova temporada! Se a primeira já não tem conteúdo, não quero nem ver a primeira. Tudo isso por causa do mistério: com quem ela fica?
Final + spoilers: com quem a Kitty fica?
Com ninguém. Kitty percebe que começou a gostar de outra pessoa. Quando a protagonista vai se declarar para Yuri, a namorada dela chega, e a Kitty vai embora. No avião, o Min Ho se declara para ela do nada e acaba a série.
Nota:
Uma estrelinha pelo visual da série e outra pela personagem da Giana Kim.

Juliana, se tivesse visto sua resenha antes nem tinha começado… rsrs
É muuuito bobo, não é para fãs de dorama, mas para fãs de séries americanas, a trivial comédia pastelão. Parece que eles querem ensinar aos americanos um pouquinho da cultura coreana, bem superficial, aí colocam umas cenas bizarras tipo a do queijo no purê, ou da bebida na boate. Todo mundo plano…
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Hahaha. Ah, eu também queria ter sido avisada. O pior é que deixa uma impressão ruim sobre nós nas pessoas que não conhecem dorama. Bem, azar o deles.
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